Roberto Campos
"Economista do Ano 1965"


 


O Brasil, já tão escasso de talentos, perdeu uma de suas maiores inteligências com a morte do embaixador Roberto Campos, economista de renome internacional. Tive a ventura de trabalhar com ele logo que me formei em 65. Sua personalidade me marcou profundamente.
Nascido de família humilde de Mato Grosso, estudou em seminário e quase ordenou-se padre. Aproveitando o conhecimento de vários idiomas que havia aprendido no seminário, fez concurso para o Itamarati, sem passar pelo Instituto Rio Branco, e tirou o primeiro lugar. Isto lhe permitiu escolher um bom lugar para começar a carreira diplomática tendo, por isso, sido nomeado para 3º Secretário da embaixada nos EUA. Resolveu então que, além da diplomacia, deveria estudar economia e pasmem - pouca gente sabe - foi, até hoje, o único estrangeiro desde a fundação da Universidade de Colúmbia a tirar nota máxima (10) em todas as matérias durante todo o curso. Sua cultura era fantástica.
Certa vez chegou ao Ministério do Planejamento uma delegação chefiada pelo arquiteto Doxiadis que havia sido contratado pelo governo carioca para fazer um plano urbanístico. Era o famoso Plano Policromático do qual fazem parte as Linhas Vermelha e Amarela. E ainda outras projetadas que continuam esperando por governantes competentes. Roberto Campos retornava de Lima e o avião atrasou. Como falo inglês, fiquei batendo papo com os gregos e fazendo as honras da casa até a chegada do Ministro. Duas horas depois ele entrava na sala e começava a reunião, falando em grego. Foi aí que soube que ele falava oito línguas. E escrevia.

Considero que a causa da liberdade perdeu um de seus maiores interlocutores. Divido o liberalismo brasileiro em três grandes autores: Joaquim Nabuco, Rui Barbosa e Roberto Campos. O primeiro pela ênfase que dava à liberdade cívica e sobre ela discorria com emoção anti escravocrata; o segundo pela suas geniais colocações no campo jurídico e político; o terceiro pela sua absoluta crença de que a liberdade econômica, expressa pelo mercado livre e baixa interferência estatal, estimularia a criatividade individual como propulsora do desenvolvimento nacional.

Era também um frasista inspirado. Um dia estávamos conversando e um inoportuno aproximou-se. Descartando-se do chato disse-me: - "Deus não foi tão misericordioso quanto dizem, afinal ele não nos deveria ter castigado permitindo o nascimento de mulheres feias e homens burros".

Roberto Campos, além de tudo era uma companhia adorável. Amante das coisas boas da vida como todo homem de bom gosto, era sempre capaz de enfeitiçar as mulheres com galanteios elegantes e sutis. Adorava a natureza e curtia o sol do Rio passeando aos domingos no calçadão de Ipanema e Leblon.

Se brilhou como economista e diplomata, não teve o mesmo desempenho como empresário e político. No primeiro caso, ocupando o diretoria do Banco União Comercial, não conseguiu fazer o Banco crescer. Como político, foi senador por Mato Grosso e deputado pelo Rio. Teve mandatos brilhantes mas eleições apertadas, perdendo sua última eleição para o Senado em 98. E a razão de suas dificuldades no campo político eram previsíveis pois seu discurso estava sempre à frente do seu tempo. Além de não fazer concessões demagógicas. Aliás, sobre isso, ele sempre citava uma frase de Rui: - "há de chegar o dia no meu país, em que dizer a verdade, não signifique insanidade política".

Roberto Campos deixa um imenso vazio na cultura brasileira mas suas obras, pela densidade, continuarão a fazer escola.

Fonte: Academia Brasileira de Letras



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